A Padroeira: A fé explorada através de um amor proibido.


Como todos sabem, hoje é o dia de nossa padroeira, uma data muito significativa para os católicos. Com isso, vou fazer uma análise da novela A Padroeira, exibida em 2001, que tinha como base a história da descoberta da santa na, então vila de Guaratinguetá. Escrita por Walcyr Carrasco, a novela esteve no ar de junho até fevereiro de 2002. A princípio, teve a direção de Walter Avancini, que também era um dos idealizadores da trama junto a Carrasco, mas durante a transmissão da novela, o diretor acabou ficando doente e vindo a falecer. Quem assumiu a direção foi Roberto Talma, que objetivou mudar algumas coisas dentro da novela, para que a audiência viesse a melhorar. Tons mais claros, novos personagens, mudanças de figurino e até mesmo de personalidade dos personagens da trama. O mocinho Valentim (Luigi Barricelli) teve os cabelos cortados, a mocinha Cecília (Deborah Secco) deixou o ar choroso e se tornou uma mulher de fibra, as casas abandonaram o tom de barro nas paredes e ganharam cores mais vivas. 

As Minas de Prata, de José de Alencar e o amor proibido da novela. 

Poucos sabem, mas a história principal do amor proibido, foi baseada no romance de José de Alencar. O livro é divido em duas partes, sendo a primeira publicada em 1865 e a segunda, no ano seguinte. Mostra a trajetória da população em meio ao Brasil do século XVIII e a luta para encontrar o roteiro que levaria às tais minas que dão título à obra, e que poderiam mudar o destino de toda a colônia, que muito comum naquele período, vivia sob ameaças holandesas. O dono do mapa é Estácio, que deve seguir vestígios deixados pelo seu pai que lhe indicariam onde estaria a mina. Ele a encontra, mas em meio a crises diante do poder, ele prefere abdicar da fortuna e viver seu grande amor por Inês. 
O Estácio da trama é Valentim, que para provar a inocência de seu pai, sai em busca das minas, que nesse caso, são de ouro. Porém, ela é de total interesse também do pai de Cecília, sua amada. Diferente da obra de Alencar, o padre ambicioso da novela era falso. Ele na verdade sempre esteve de olho na fortuna de Valentim, assim como Padre Molina do livro, só que assume a identidade de cardial com o objetivo de botar as mãos no mapa. Ele tem o auxílio de sua esposa, a espanhola Blanca (Patrícia França), que se envolve com Valentim com o intuito de ajudar o marido, mas acaba se apaixonando por ele. 
Outro empecilho no romance de Cecília e Valetim é Dom Fernão de Avelar (Maurício Mattar). Ele foi jurado à jovem de casamento e com isso, o romance dela se tornou algo impossível. Contudo, ela sofre ao extremo nas mãos do vilão da trama, mesmo oscilando algumas vezes entre os dois rapazes, ela acaba a trama com Valentim. O final da história do casal teve referência a outro grande romance mundial, Romeu e Julieta, no qual Cecília toma uma poção com o intuito de não se casar novamente com Dom Fernão. Valentim, sem saber do ocorrido quase se mata para ser eternamente feliz ao lado de sua amada. Mas descobre a tempo de não cometer tamanho erro e assim, os dois encerram a jornada juntos. 

Realidade e ficção: a história de Nossa Senhora Aparecida. 

O nome da trama não estava lá à toa, a vila onde acontece a história de amor de Cecília e Valentim é onde aparece a imagem da santa padroeira. Em meio às buscas pelas minas de ouro, estão os pescadores, que têm de atender aos interesses dos mais poderosos do local. Eles passam muito tempo sem conseguir pescar um peixe, até que certo dia são jurados de castigo, caso voltem sem os peixes, que seriam preparados em homenagem ao Conde de Assumar (Antônio Marques), pai de Cecília. 
Depois de muito tempo tentando, eles conseguem apenas pescar uma imagem sem cabeça. Jogam a rede novamente e pegam a cabeça da santa. Acreditando que isso seja um milagre, eles insistem em jogar a rede e acabam pescando uma quantidade enorme de peixes. Ao longo da trama, mostra a luta dos pescadores para a comprovação da imagem como santa e pela construção da capela para a mesma. Além do fato da imagem garantir certo poder aos pescadores, outro empecilho na construção da capela é o fato de a imagem ser negra, contrariando os poderosos por decorrência do preconceito exorbitante da época. 
O primeiro milagre de Nossa Senhora Aparecida é quando as velas do pequeno altar erguido para ela balançam, misteriosamente. O segundo milagre diz respeito ao escravo Zacarias (Norton Nascimento) que teve seus grilhões arrebentados diante da imagem da santa - os grilhões inclusive se encontram na basílica na cidade de Aparecida. O terceiro milagre é considerado um dos mais importantes, e dentro da trama ocorreu na família de Cecília, diz respeito à cegueira de sua irmã Marcelina (Renata Nascimento) que volta a enxergar graças à Nossa Senhora. Tal feito foi responsável pela aceitação do poderoso Dom Lourenço (Paulo Goulart) de construir a capela para a santa, se tornando a basílica de hoje. 
Outro acontecimento considerado milagre é quando Dom Fernão, revoltado, tenta invadir a capela da santa com o intuito de destruir a imagem, mas os pés de seu cavalo acabam ficando presos na escada da capela. Está entre as histórias reais compartilhadas a respeito de Nossa Senhora Aparecida. 

A trama retratou um século XVIII pouco explorado em telenovelas, talvez por conta desse lado sombrio e submisso do período brasileiro. Seus números de audiências não foram muito satisfatórios e a trama oscila entre as de menores audiências do autor - que traz uma bagagem de grandes sucessos no horário, como O Cravo e a Rosa e Alma Gêmea. Na minha opinião, é uma das melhores obras de Walcyr Carrasco, onde o autor conseguiu trabalhar bem a dualidade da trama, mostrando sempre o triângulo amoroso principal e nunca deixando de lado a história da padroeira, desde sua descoberta até seus milagres.