O merchandising social que não deu certo.



Mesmo meio debilitado, não podia deixar passar em branco a atual situação que se encontra a novela das nove, Amor à Vida. Entre tabus que serão tratados e outros que serão engavetados, está o inédito preconceito contra pessoas acima do peso. Antes de mais nada, me acho no direito de discorrer sobre o tema pelo simples fato de que me incluo nessas pessoas, apesar de não me sentir ofendido por piadinhas medíocres como acontece com a personagem Perséfone (Fabiana Karla). 
O tal do merchandising social já foi usado e abusado nas novelas, e se tornou ponto forte das tramas brasileiras. Se no México eles apelam para dramalhões familiares, aqui, os autores apelam para histórias de preconceito social, racial, contra homossexuais, além de falar de alcoolismo e outros distúrbios da sociedade contemporânea. Quando Walcyr assumiu o posto do horário nobre, claro que ele deve ter pensando em exagerar na dose do merchandising social para garantir público. E o fez, como Manoel Carlos tem costume de fazer, em doses "cavalares". Câncer de mama, homofobia, autismo, entre outros, foram temas decorrentes na trama; mas um em especial vem chamando a atenção, pela maneira como vem sendo abordado: o preconceito contra pessoas gordas. 

Sempre de uma maneira pejorativa, o autor trouxe Perséfone para nossa sala com o intuito de trazer o riso diante das peripécias de uma mulher virgem. Mas não parou aí, intrínseco a esse tema, ele mostrou como as pessoas gordinhas são tratadas. Mas até que ponto isso é verdade?! Pois é, nunca na TV um tema sobre preconceito foi tratado de maneira tão pejorativa e humilhante - inclusive para a própria atriz, que apesar de estar dando vida à uma personagem, acaba sendo na vida real o alvo dos xingamentos. Sei bem que nem todos são assim, passivos diante das ofensas do dia-a-dia e sei também que é uma obra de ficção, logo não deve ser levada tão ao pé da letra. Mas não tem como passar em branco, afinal, a maioria dos personagens que foram vítimas de preconceito nas novelas, não só deram a volta por cima como não aceitaram de cabeça baixa os "agressores" falarem o que lhes desse na telha. 

Porque levar a sério o tema do preconceito contra gordinhos, se a personagem deixa a própria amiga usar de zombaria com ela. É, Patrícia (Maria Casadevall) não foi e nem é das amigas mais legais. A moça empurra a Perséfone para qualquer homem e faz questão de alegar que ela não está em condições de escolha. Que tipo de amigo é esse que te coloca pra baixo? Pode mesmo ser chamado de amigo? Além dessa, o "amigo" Michel (Caio Castro) é outro que tinha tudo para ter tato ao falar sobre obesidade e assuntos do gênero, porém as coisas não fluíram bem assim. Ele é endocrinologista e, inclusive durante um dos atendimentos, tratou de forma anti-ética sua paciente. Logo, ele deveria estar acostumado com esse mundo de gordinhos que se sentem mal e buscam ajuda para isso; sendo assim, falar da maneira com ele fala para a Perséfone não a ajuda em nada. 
Em suma, acho que Walcyr errou na mão ao tratar de um assunto tão complexo e ao mesmo tempo tão necessário. Sabemos que existe certo preconceito contra os quilos a mais, mas a maneiro como ele criou os entornos dessa história não foram dos mais verossímeis. Uma família que sofre com o tabu que ainda é o autismo no Brasil, ter preconceito porque a mulher com quem o filho vai se casar está acima do peso é algo meio questionável. Assim como a passividade - já falada - de Perséfone para com o mundo é algo revoltante para qualquer pessoa que se vê ferida pelas injustiças do dia-a-dia. Então, Walcyr, acho que você tomou a decisão certa ao pedir à cúpula da emissora seu retorno ao horário das seis. Afinal, brincar de escrever novela das oito é algo complicado!