Overdose de Walcyr Carrasco


Acabei de acompanhar a estreia de O Cravo e a Rosa. A novela não foi o objeto mais cativante da TV nesta segunda-feira, porém teve a quem agradar. Eu sou antipatizado por ela, desde sua primeira exibição, quando eu tinha apenas onze anos. Acho que, no meu caso, é porque sofro de um mal em antipatizar com coisas que caem no gosto popular - haja vista tamanha ojeriza que sinto por best sellers. A questão é que ao acompanhar a atração vespertina, já criticada anteriormente neste blog, percebi que ela recebeu críticas positivas de eternos fãs e negativas, mas não no sentido da novela ser ruim, mas no sentido de ser transmitida pela segunda vez no Vale a Pena Ver de Novo. Como já manifestei minha opinião a respeito disso, vou focar em uma das causas que pode estar gerando tanto burburinho a respeito da re-reprise de O Cravo e a Rosa: a exibição de Amor à Vida. Leigos perguntarão o que tem isso a ver, mas noveleiros sabem muito bem do que estou falando. A atual novela das nove é escrita por Walcyr Carrasco, e se antes a Globo fugia dessas 'overdoses' de autores - a emissora desconsiderou transmitir O Clone na época em que era exibida Caminho das Índias, por medo de saturar o público com os textos de Glória Perez -, hoje a emissora ligou seu botão 'DANE-SE' e simplesmente transmitiu o que achava que daria audiência. Antes da exibição de O Profeta, foi transmitida Da Cor do Pecado, que coincidiu com a exibição de Avenida Brasil, ambas de João Emanuel Carneiro.


A trama não atingiu a audiência esperada, mas também não sofreu duras críticas por ter sido transmitida duas vezes no quadro de reprises da Globo, como ocorrido com O Cravo e a Rosa. Porquê? Simples, apesar de mesmo texto, o autor criou duas histórias muito distantes. Não digo só a respeito de locação, figurino ou elenco, mas digo a respeito do texto falado mesmo, da trajetória dos personagens. Talvez se fossem transmitidas ao mesmo tempo Avenida Brasil e A Favorita, os telespectadores se sentissem incomodados com tamanha semelhança, mas com Da Cor do Pecado foi diferente.


Logo, vimos que João Emanuel amadureceu ao longo de sua trajetória na TV, mudou consideravelmente o texto de suas novelas das sete para suas novelas das oito. Você deve estar se perguntando: Onde você quer chegar? Quero dizer que apesar do Walcyr ter se adaptado ao tão temido/desejado horário das oito, ele ainda traz resquícios de novelas das seis, onde se firmou como um dos maiores autores da emissora. Texto muitas vezes batidos, decorados, 'forçados'; tal afirmação coincide com os rumores de que ele odeia que o ator interfira em suas escritas, como criar seus próprios diálogos ou os famosos 'cacos' (falas que se cruzam durante a cena, como na mesa de jantar da família de Tufão), que fizeram de Avenida Brasil uma novela inovadora. Outra grande problemática de Amor à Vida, que faz com que fique com aquela cara de novela das seis, é o bordão praticamente forçado dos personagens - Félix salgou tanto a Santa Ceia que acabou perdendo o próprio 'sal'. Ok, com Glória Perez deu certo, mas nem todos autores tem a mesma sorte dela. Aliás, tanto os tempos são outros que em Salve Jorge, não vimos tal artimanha da autora; ou ela viu que não ia 'rolar' ou ela simplesmente voou tanto com as histórias, que nem teve tempo para criar bordões 'chicletes'. Walcyr, entenda, em novela das seis, no máximo nas das sete, isso dá certo, mas em novelas das oito, "o buraco é mais embaixo". A atual trama das nove tem ótimos índices de audiência, apesar de não ser o maior sucesso do horário, como muito se esperava. Porém, tem momentos em que o 'espírito de autor das seis' grita na alma de Walcyr e nos deixa perplexos diante de tanta 'asneira' ou repetição. Porque estou falando isso? Porque cansa um pouco ver a Perséfone e a Valdirene, ambas em suas tentativas frustradas, uma em deixar de ser virgem, a outra em encontrar um milionário. E nessa caminhada das personagens, as situações são sempre as mesmas, como visto outras vezes em novelas do autor - Mirna (Alma Gêmea), por exemplo, passou a novela toda tentando se casar.


Bom, eu acho que a reprise de O Cravo e a Rosa só serviu para vermos que Walcyr foi bom sim, em sua primeira novela na emissora. Ao longo disso, sua carreira foi regada a 'repetecos', seja no humor utilizado - sempre alguém ia parar em algum chiqueiro -, seja no próprio texto 'declamado' pelos atores. Bom, pra ilustrar isso, deixo o diálogo do comentarista Nilson Xavier, hoje no Twitter:


Enfim, não me condenem! Apenas acho que Walcyr precisa aceitar mais que novela das oito precisa de mais cuidados e mais liberdade nos textos. Creio também que certos 'humores' não cabem em alguns horários onde o público é mais exigente. Saiba que nem toda Valdirene será uma Suelen, nem todo autor consegue criar tipos tão bem quanto outros.


 E que o ouvido dos telespectadores pode doer diante de certas frases faladas durante os OITO MESES de exibição de uma novela. Espero que ele melhore gradativamente, como ocorreu com suas novelas das sete - Sete Pecados foi crua, em Caras & Bocas ele parecia mais confiante e finalizou muito bem com Morde & Assopra, mesmo usando de recursos do realismo fantástico. E por fim, lhes digo que gosto sim, de Amor à Vida, mas em certos momentos da novela, chego a cogitar a hipótese de que o teste de DNA do Ratinho deva estar mais emocionante (ou pelo menos não será repetitivo).